Em um caso sem precedentes na Justiça paraibana, a juíza Flávia da Costa Lins, titular do 1º Juizado Especial da Fazenda Pública da Capital, decidiu pela possibilidade de um cachorro figurar como autor de uma ação judicial, desde que representado por seu tutor. O processo, movido contra o Município de João Pessoa, envolve uma alegação de erro médico ocorrido em uma clínica veterinária municipal.
A magistrada destacou que “é a primeira vez que se aceita o animal doméstico como legitimado para figurar no polo ativo de ação no juizado fazendário”, trazendo ao debate os impactos jurídicos e os danos alegadamente causados ao cachorro “Pelado” durante o atendimento prestado por agentes públicos.
Durante a audiência, foi questionada a legitimidade do animal para ingressar com a ação. No entanto, conforme ressaltado na decisão, a solução encontrada foi permitir a participação do cão no processo por meio de seu tutor legal. “Ficou decidido pela possibilidade de o animal doméstico em questão, desde que devidamente representado, figurar no polo ativo desta demanda”, explicou a juíza.
Diante da ausência de acordo na tentativa de conciliação, a magistrada determinou a realização de uma avaliação veterinária no animal, visando apurar a veracidade das alegações e eventuais danos sofridos. Em sua fundamentação, enfatizou que “a Justiça deve acompanhar a evolução dos fatos e, nesse sentido, deve se dar especial relevância às relações afetivas e jurídicas existentes entre o homem e os animais domésticos”.
Análise Jurídica
A decisão abre um importante debate sobre o reconhecimento de direitos dos animais no âmbito judicial e a possibilidade de sua representação legal. No ordenamento jurídico brasileiro, os animais são tradicionalmente considerados bens semoventes, ou seja, possuem tutela jurídica, mas não são sujeitos de direitos. No entanto, há um movimento crescente na doutrina e na jurisprudência para ampliar a proteção jurídica dos animais, considerando aspectos como a dignidade e a relação socioafetiva entre pets e seus tutores.
Do ponto de vista processual, a decisão traz reflexões sobre a legitimidade ativa em ações dessa natureza. A necessidade de representação pelo tutor parece ser uma solução intermediária para viabilizar a tramitação da ação, sem afastar o papel central do animal na demanda.
Este caso pode servir de referência para futuras discussões jurídicas, sobretudo no campo do direito animal e da responsabilidade civil do Estado no atendimento veterinário público. Resta aguardar os desdobramentos e eventuais questionamentos sobre a constitucionalidade e a segurança jurídica dessa inovação.